terça-feira, novembro 04, 2014

Phaunos

I've met a faun once.
But at a glance,
in the blink of an eye,
he disappeared.

Havia o desejo da procura.

Até aqui havia também reciprocidade.

A espera, quarenta anos bíblicos, teve seu fim na casualidade de um clique.Um curtir, que os antigos talvez só possam entender como cultivar. Mas nós, hoje, não entenderíamos assim com tanta facilidade. Ainda transitamos, confusamente, entre curtir e cultuar.

Após este toque mútuo, uma sucessão de perguntas sinceras, despudoradas, radicais. Ânsias duplicadas em deixar claro os limites d'um encontro. Esta sucessão frenética de diálogos intensos seguiu-se por mais três dias. No quarto dia, confiados nos luzeiros da criação, ambos nos movemos sobre a terra na intenção de amiudar, até então, a distância entre nós.

A primeira troca de olhares. A primeira saudação. As primeiras palavras. As orientações para dirigir até o lugar apropriado. Estas ações todas tentaram amenizar o estranhamento ainda presente naquele momento. Fomos cedendo à presença um do outro, até estarmos entre quatro paredes silenciosas.

Tudo parecia ir bem, como se esperava que fosse, após planejamentos detalhados, acordos consensuais, desejos calculados e medidos, preocupação com o prazer do outro. Mas a circunstância do momento, a condição das primeiras vezes, nos colocaram no idílio de olhares e desejos assustados. Nem todo estranhamento havia sido desfeito. Sucedeu-se o fracasso. Vieram momentos de compreensão, uma poesia, uma música. Ah, endemoniadamente, os faunos cantam. Candura e singeleza misturados ao frêmito da última tentativa de prazer não efetivada. Este fauno me cantou em francês.

Então procedeu-se uma conversa de trivialidades. Na realidade, mais um monólogo, enquanto tentava aplacar a irrealização do conúbio idealizado, com carícias últimas e um silêncio ouvinte, enquanto o outro se desfazia em narrativas autorreferentes, entremeadas com bocejos sucessivos, quase metódicos, mas certamente mais sintomáticos que simbólicos.

E chegou-nos a hora de partir. Fomos nos recompondo, cada um à sua maneira, pois cada um devia recuperar a seu mundo. Compartilhamos ainda o transporte, os momentos finais de um regalo esperado e, por fim, voltamos ao mundo ausente de quatro paredes. Voltamos à multidão, sem sequer pensar numa multidão de lacunas que começavam a surgir entre nós, em nós.

Veio a hora do adeus. As promessas, agora, foram menores, mudas, quase inexistentes, pois o próprio adeus parecia, sozinho, ocupar todo espaço cada vez mais alargado entre nós. Nem mesmo o último ósculo fez diminuir esta distância, pelo contrário, ósculo contrário e reverso, divisor de corpos, de desejos, ampliador de espaços, quase ósculo da discórdia, mas, com certeza, ósculo da distanciação.

Primeiro na penumbra, depois na curva de uma esquina. Ele sumiu. Tentei olhar para trás, mas as sombras tornavam uno todo aquele passado. Só me restavam as certezas do encontro e da partida. As incertezas... melhor não enumerá-las.

He disappeared
like all the others do,
magically,
for hi is a faun.


Paraíso, 02-11-14

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